Brasilim, capital de um país longínquo, ainda situada longe do mar, num planalto quase deserto, não tem ainda cinquenta anos e já apresenta problemas. O pior deles é uma praga que vem crescendo assustadoramente e levando a população a grande sofrimento. Há ali uma invasão de ratos e tamanha é a sua quantidade que se pensa em recorrer a um personagem do qual não se ouve falar há mais de quinhentos anos, desde que salvou a cidade de Hamelin, na Alemanha. Seu nome não passou à história, mas sabe-se que costuma aparecer voluntariamente quando percebe que sua presença se torna necessária.
Os ratos de Brasilim tomam tudo para si. Sua voracidade, apetite, edacidade, glutoneria, pantagruelismo, hiperorexia, bulimia, acoria, cinorexia, abarcia não respeitam nada nem ninguém. Devoram o que esteja em qualquer lugar, preferencialmente o que lhes sacie a sede a e a fome do ouro, da riqueza fácil, do lucro imediato, do ganho sem esforço e sem trabalho. Além disso, se reproduzem em grande velocidade e se organizam de maneira perfeita, solidária, ocupando postos avançados, obedecendo a uma hierarquia de causar inveja às mais famosas tiranias de todos os tempos e repetindo ad aeternum as técnicas do nepotismo, do uso de laranjas e outras manhas aprendidas na impunidade e na herança escolada de pais para filhos, no corporativismo, na certeza de que não há risco de que alguém se atreva a atirar a primeira pedra, já que são todos farinha do mesmo saco.
Ali estão ratoneiros, ratuínas, ratos secretos, todos os tipos de murídeos, a fazer trampolinagens, de que são vitimas os que vão cair na esparrela, na arriosca, na falcatrua que eles preparam, sendo que eles nunca caem na ratoeira.
Assassinos, sem quererem crer que o sejam, deixam morrer crianças por falta de leitos hospitalares, de vacinas, de médicos, de atendimento oportuno, de hospitais com CTI e muito mais. Criminosos, por reterem para si as verbas que seriam destinadas a obras sociais, a transporte coletivo, a escolas, a salários dignos aos trabalhadores. Facínoras, pritaneus, assaltantes, corruptos e corruptores, cruéis, torpes, ignóbeis, espertalhões, energúmenos, traiçoeiros, trapaceiros, intrujões, sicofantas, sevandijas, devassos, parasitas, repugnantes, ultrajantes, indecorosos, dissolutos, mentirosos, aproveitadores, sem respeito, sem honra, indecentes, vermes, imorais, desalmados, aéticos, malfeitores, vigaristas, corja de bandidos, súcia, celerados, falsários, estelionatários, apátridas, sórdidos, salafrários, salteadores, safardanas, quadrilheiros, perversos, podres, devassos, subornadores, sem caráter, corrompidos, cínicos, indignos, depravados, canalhas, infames, velhacos, demoníacos, larápios, ladravazes, gatunos, caras-de-pau, crápulas, biltres, ladroaços, vis, sem-vergonhas, abjetos, caterva, antropófagos e tubarões com PHD em trampolinagens.
Que o flautista de Hamelin os leve a todos até o Paranoá, onde os jacarés os aguardam com a mesma voracidade demonstrada por todos eles, e que recompense o benfeitor, não com pagamento em dinheiro, mas com a gratidão dos homens bons pela queda da mortalidade infantil, da diminuição da criminalidade, da volta da credibilidade, da decência, do patriotismo e da verdadeira cidadania.